sexta-feira, 11 de julho de 2008

Parecia dormir com seu vestido florido predileto, ou arrumada para ir a algum lugar, alguma festa, encontrar uma amiga, fazer compras. Ela adorava aquele vestido, chegava a usá-lo quase durante toda a semana. Agora ela usaria para sempre.
No velório as pessoas vinham dar os pêsames a Fabiano, embora ele não estivesse mais casado com ela. O namorado atual mal era notado, embora suas lágrimas parecessem sinceras. Fabiano entendia bem aquele choro, entendia bem como foi conhecer aquela garota, como foi viver com ela por tanto tempo. Ele sim deu os pêsames a ele, e trocaram um olhar, um olhar que dizia muito, que falava mais do que todos os “sinto muito” que eram ditos ali.

Fabiano se afastou, e saiu da sala. Fora havia um jardim, ele parou, acendeu um cigarro, e pensou. Pensou profundamente sobre tudo o que aconteceu. Porra, como pode uma coisa dessas. Porra, porra e porra. Ela era tão saudável, vegetariana, como isso, como isso? Tantas perguntas, tantas teorias, ciência, alimentação saudável, não fumar, não beber e um câncer. Sim, um câncer a comeu inteira, a devorou, a matou em menos de dois meses. Ele nem sequer pode se despedir. Aquela maldita briga, ficaram sem se falar por apenas quatro meses, e agora. Agora ele queria se desculpar, por tudo que disse, e queria escutar desculpas, por tudo que escutou. Não, agora não há mais o que dizer, não há mais o que trocar.
Por que não acredito em Deus, por quê? Se acreditasse, poderia agora dizer tudo o que nunca mais poderei.

Fabiano caminha junto a outras pessoas. No ombro carrega mais do que o peso de um caixão, ele carrega junto lembranças, carrega parte de uma vida que presenciou e participou, histórias, fatos, brigas, choros de amor, problemas compartilhados que pesam muito mais do que qualquer massa física. Escuta o choro da família, e não consegue conter seu próprio choro. É inverno, as lágrimas doem, doem duplamente, doem física e sentimentalmente. Aquela sensação de abaixar o caixão, não era só ela que estava sendo enterrada ali, alguma outra coisa que ele não podia saber também estava, a contragosto, estava indo, para algum lugar, ou para o nada.

As pessoas começavam a jogar flores no túmulo. Ele estava com uma rosa na mão, mas ficou paralisado. Olhava aquelas flores vivas, e lembrava de seu rosto falecido. Começo a pensar na contradição disso tudo, aquelas flores tão vivas, tão coloridas, por que iam também ser sepultadas naquela cova? As pessoas colocam flores vivas na esperança de dar a alguém querido algo que já não possuem, a vida. O pensamento disso tudo o tirou da realidade, até ser abraçado pelo pai. Vai, filho, joga a sua flor também. Não pai, não há flor nessa terra do tamanho do meu

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